segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Flautim de soluços



Ela regava em nota...
Feito cachoeira que brota
Desconsoladamente feito criança sem colo
Desesperadamente, solitariamente
Sem consolo, porto ou abrigo
Sem carinho, abraço ou amigo
Soluços ecoavam como flautim
Tuim, tuim...
“Há um punhal em mim”.


Anne Andrade
05 de agosto de 2010

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O sentido do vazio

O vazio, muitas vezes esvazia o vazio anterior, que de tão vazio, percebe-se que existe algo ali. Quantas vezes nos sufocamos na rotina, nas obrigações, no que é de fora, trabalho, convívio social, e não nos damos conta que é nesse “muito” que mora o vazio. Descobre-se o vazio do ser. “Quem sou? Não sei mais, só sei o que faço e o que devo fazer”. Muitos buscam insaciavelmente em coisas e em outras pessoas, preencher o vazio do ser que os perturba, tentativa inútil.
Muitas vezes até me aborreço, pois constantemente caio nessa solidão. Sem alguém ou algo por perto, deparo-me com o vazio, que me obriga que eu me transporte para dentro de mim, que eu me conheça e me reconheça, para que eu perceba o que sou, faço, quero, preciso, amo, e o que e quem verdadeiramente me importa; e assim, o vazio dá sentido e fôrma à minha vida, fôrma que dá forma à minha forma.
O vazio talvez seja a porta para o preenchimento da alma, a resposta às perguntas que se tem sobre si, e um copo com água num deserto repleto de miragens. A única e verdadeira água que mata a sede da essência, sacia, conforta e  possui o mais nítido espelho da minh’alma, que me instiga a refletir, e reflete a mim, quem sou.

Anne Andrade
22 de setembro de 2010

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Cadê tua mãe, Criança?

Em que sustenta teus pés?
O que te dá prazer?
Que dá sentido ao que és
Que te impulsiona a viver

Qual tua premissa maior?
Onde guarda a fé tua?
Que fazes para não andar só?
Andas de ré, mi, fa, sol ou lua?

Por quem chamas
Quando a tristeza te invade?
A que tu amas?
E quem te ama de verdade?

Onde teu barco se ancora?
Qual é teu porto seguro?
O que te segura agora?
O que te desce do muro?
Em quem deposita teu futuro?

Onde confia tua esperança?
Numa garrafa, aliança?
Cadê tua mãe, criança?

Anne Andrade
18 de setembro de 2010

terça-feira, 7 de setembro de 2010

O Beijo

Um punhal no peito te atravessava
Segurava fortemente minha mão
E um beijo me implorava
Aquele que mil vezes eu dissera não

Cumpri teu último desejo
Enquanto a morte te conduzia
Meus lábios mornos selavam um beijo
Na tua boca pálida e fria

Beijo que feriu minha paz
Revelando-me, por fim
Que era teu, e de ninguém mais
Todo o amor que havia em mim.

Anne Andrade
06 de setembro de 2010

Astro Rei



Brilhantíssimo Sol
Astro rei que me alimenta
Da aurora ao arrebol
Ilumina e esquenta

Hoje eu vi
Que feliz estava
E tua alegria senti
Na hipoderme da alma

Teu brilho clareou
A escuridão que havia
E teu calor me abraçou
Convertendo noite em dia

Notei num instante
Que para mim sorriu
Estava tão radiante
Naquele céu de anil

Teus raios hei de tragar
E tua luz, traduzir
O que em teus fótons há?
E nesse dom de reluzir?

Despeço-me de ti
Num adeus crepuscular
Mas já te espero aqui
Sentada à beira-mar.

Anne Andrade
05 de setembro de 2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Pedrinha

Tinha uma pedra no meio do caminho
Pedra rara de muito valor
Tão invocada quanto um bichinho
Tão patética quanto um ator

Amei aquela pedrinha
E para mim roubei
Chamei-a de minha
E em meu bolso guardei

Anne Andrade
03 de setembro de 2010

Navegamos

Somos barcos, caravelas, canoas, navios, que cruzam os oceanos da vida em busca de aventura, conhecimento, experiência, superações, alegrias. Enfrentando tempestades, descobrindo os segredos do temido mar, que hora está calmo, bom pra navegar. Outras horas, agitado, furioso, e naufraga os mais fracos. Podemos navegar por rotas conhecidas, ou traçar nossa própria rota. Os destemidos se imortalizam na história. Aventureiros cruzam os mares e contornam os ventos, os que tem medo, que tentam navegar em linha reta, são arrastados pelos ventos pra lugares distantes, instigados a vencer o medo e provar de aventuras e desventuras, a aprender a navegar (viver). Não importa qual rota seguimos, importa que estamos navegando "navegar é preciso", e nesse caso, viver é navegar. Seguimos pelos oceanos, e almejamos um cais, fim de rota, terra firme, tempo e motivo de se orgulhar pela grande navegação. Mal sabemos que depois no cais, o fim da rota é o fim da existência, aí então deixamos nosso legado e nossa história.

Anne Andrade

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Claro sobre trilhos


Faz isso não
Poupe tua vida
Sonhe de pé no chão
Antes chegada que partida

Não se atire
Isso aqui é precipício
Mas não se retire
Da sina do início

Não se jogue também
Aí trilhos são
Eis que vem o trem
Pode ver aquele clarão?

Aquele claro não é liberdade
Nem tampouco salvação
Vem mostrar-te a verdade
Trazer-te a decepção
 

O claro vai fazer
Teus sonhos caírem por terra
E tua alma há de ser
Arruinada sem reserva

O claro vai te mostrar
Quão miserável que és
E há de derrubar
O que sustenta teus pés

O claro vai revelar
Que tu não tens caminho
Nunca tiveras lar
E sempre fora sozinho

O claro dará fim
A esses teus sonhos mesquinhos
E desse teu jardim
Mostrar-te-a espinhos

Esse mundinho que você se esconde
Será esmiuçado e convertido a pó
E o vento o soprará para longe
Sem pesar, piedade ou dó.

Fala pra mim
Está vendo aquele clarão?
Ele traz consigo teu fim
Em seu último vagão


Anne Andrade
30 de agosto de 2010